sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A Oferenda da Bruxa

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Boas,
Neste que é o dia de São Valentim, trago-vos uma short storie especialmente preparada para a ocasião, mas com um toque a meu jeito:


Sinion é uma cidade primaveril, convida o sol a entrar, e presenteia os habitantes com um espetáculo de cores impar. O segredo está nas grandes vidraças das casas, característica própria só de Sinion. A festa das Flores está à porta, e as ruas estendem-se com o arco-íris.
Tamanha beleza era de encantar qualquer um, mas Zimar oferecia a sua admiração à pessoa que segurava seu braço, enchendo-o de orgulho, porque no meio de tanto fascino, Jocil a filha do cerieiro ainda roubava a atenção de muita gente mas entregava a sua só a ele. A perplexidade do noivado ainda via replicações meses depois, e muitos não se continham em questionar-se, e até ao próprio Zimar, do como ter conseguido tal proeza. De como alguém com uma beleza tão fora do comum podia ficar depois com; bem, alguém tão comum.
Jocil era, indiscutivelmente, a donzela mais bela da cidade, o que a tornava ainda mais interessante é que não o via. Era, de facto, tão bonita que intimidava os mais audazes a nunca se declarar, resposta sempre oferecida com um sorriso pelo jovem Zimar, e que era verdade, mas que nunca dava descanso à perplexidade dos que questionavam, talvez porque Zimar, jovem esguio, aprendiz de ferreiro, tinha desperdiçado todos os chamamentos de coragem na sua vida. A única verdadeira coragem que alguma mostrou foi quando embrenhou-se no bosque, bem para além do que a maioria se aventurou, um segredo seu. Lá, Zimar procurou o que se acreditava impossível, mas tudo é possível para aqueles com os talentos certos.
Bem embrenhado no bosque, onde a luz diminui e o ar densa-se, havia um casebre e nele vivia uma bruxa. O aprendiz de ferreiro ofereceu todas as suas economias, e até a arte do seu trabalho por um ano, para pagar o que tinha ido lá buscar, com tanta querença. Pensou ser brincadeira ao principio, mas depois, pechincha de uma velha que já não devia ter todas as suas capacidades mentais intactas, quando a bruxa lhe disse ser paga suficiente apenas o desenrolar de eventos que tal coisa lhe iria trazer.
Jocil tirara-lhe quase todo o baixo auto-estima que nele sempre existiu, realçando-o acima de tantos e a par dos poucos valorosos do reino. Explicou-lhe a verdadeira importância que teve, por exemplo, na defesa do reino, dois anos antes quando as hordas bárbaras desceram do norte, “Foi com as armas que criaste que puderam mante-los afastados”. Sim havia valor naquilo que fazia, mesmo que nem de um ferreiro, por inteiro, se tratasse, ela pelo menos o via assim, e a opinião dela era tudo o que importava.
Jocil tinha sido a melhor coisa que lhe acontecera, e em troca ele dava-lhe o melhor de si mesmo, mas em seu segredo retinha um receio que explicava o quase da purga da sua baixa auto estima. Quando, certa manhã, acordara para ver sua amada segurar o objecto do seu afogo, seu coração estacou. Receara acima de tudo ser descoberto, te-la decidir entre esta felicidade fabricada ou a espontânea trazida a todos. Pois cada dia, com discrição, conseguira fazê-la beber um pouco da poção do amor, adquirida naquele dia no bosque.
Tudo vem com um preço; não o percebera na altura, mas percebia-o agora. A delicia no olhar da bruxa com a angustia que o seguiria até o desvendar de tudo, até à possibilidade de voltar a ser quem era, insignificante.



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